Da janela da pensão, ele via a via abaixo, a tensão do protesto que já tomava conta das ruas, as caras e caretas dos manifestantes manifestados, era o reflexo da primavera Árabe naquele país. Crianças, jovens, adultos e velhos marchavam sobre o asfalto quente de Islamabad naquela tarde avermelhada e seca. Os soldados e os policiais já estavam posicionados, armados até os dentes e prontos para qualquer confronto.
Deu três beijos no alcorão. Pronunciou umas palavras
esquisitas, tomou o copo d’água que estava em cima do criado mudo. Acendeu um
cigarro, Marlboro, pra variar. Enxugou o suor da testa com a mão esquerda, colocou
o casaco cinza, o abotoou deixando abertos apenas os dois botões de cima e saiu do quarto.
Caminhou até a rua, em passadas tranquilas para não
despertar suspeita. A rua estava entupida de gente gritando palavras de ordem.
Passavam das duas horas da tarde, já se aproximava o horário da terceira oração
do dia, a Salát Al-Açr. A mesquita de
Faisal, no centro da cidade, já estava cheia de fiéis. Lugar sagrado e nem um
pouco harmonioso. Esperou na rua, próximo a uma banca de feirantes, o sinal.
Quanto mais se aproximava
da hora, mais sua respiração ficava ofegante. A tensão aumentava. A adrenalina possuía
seu corpo. Lábios tremiam. Suas mãos suavam. A garganta secou. Não podia
desistir. Aquele era o momento. Já estava tudo certo. Foram meses de
planejamento, meses de oração solicitando proteção e coragem a “Alah”. Não
podia decepcionar a si próprio. Aquilo tinha que ser feito, em nome de sua paz.
O Sinal, o ônibus de turistas.
Pessoas desembarcavam, caminhavam em direção a mesquita. Ele pronunciou
novamente as palavras esquisitas, puxou o casaco para frente e abotoou os botões que ficaram abertos. Era
uma tarde quente, mas ninguém notou aquele homem, de barba por fazer, com um casaco
cinza, como se escondesse algo. Parado. Vigiando o quarteirão.
Começou
a caminhar em
passos trêmulos. O lugar marcado era a entrada da mesquita. Naquele
momento ele não
ouvia mais os gritos e nem notava a multidão de manifestantes ao seu
redor que já estava em confronto com os soldados e a polícia.
Suava frio, enxugou o suor da testa com a mão esquerda. Olhava fixo para
o
lugar marcado. Ao chegar naquele local, hesitou. Pronunciou mais uma vez
as
palavras esquisitas, dessa vez com mais fé e em alto e bom som, e foi...
Parou.
Fechou os olhos... Respirou bem fundo e... A chamou pelo nome.
Ela estava de costas, na entrada da mesquita,
com um manto azul na cabeça, lábios rosados e cheirava a alfazema do campo. Linda,
como ele imaginara, muito bela. Depois de meses trocando e-mails, meses de
planejamento, enfim, os dois puderam se olhar, estavam frente a frente.
Não era um lugar adequado
para um encontro, mas ela como boa repórter, gostava de adrenalina e de correr riscos. Também queria
conhecer Islamabad como era, seu povo, suas crenças e seus perigos.
Ele tímido, ainda suando frio, abriu o casaco
e entregou-lhe o buquê de gérberas que havia comprado. Ficou por minutos olhando
aqueles olhos azuis celestes e ouvindo-a contar de sua viagem.
Mal se conheciam, mas ele já sabia que aquela "mina" iria deixá-lo nos ares...
É muito bom descobrir que além da poesia você navega em outros mares da esc rita. E com maestria e poesia.
ResponderExcluirLeitura deliciosa e cheio de suspense.
Beijo
Clau Assi
Obrigado Clau Assi...
ResponderExcluirBjo!